quarta-feira, 9 de novembro de 2011

Senado quer campanhas financiadas pelo Estado

Um dos itens mais polêmicos em discussão na Reforma Eleitoral, o financiamento pú­­­blico de campanhas tem implicações diretas em toda a estrutura política brasileira. Por um lado, esse tipo de financiamento é visto como uma resposta a diversos escândalos que envolvem os representantes do povo, já que eliminaria a figura do financiador de campanhas. É provável que isso amenize a corrupção no país e que, também, reduza as diferenças entre candidatos ricos e pobres – embora nem todos concordem com essa tese. Ainda assim, há o aumento sensível do custo das eleições para o Estado: a União teria de arcar com quase R$ 1 bilhão por eleição. Além disso, há quem diga que esse modelo esconda as relações entre em­­­presas e governos.
Aprovada pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado, a proposta que saiu das reuniões da Comissão de Reforma Política da Casa é radical: deixa todo o custo para a União. Se essa proposta for aprovada, não será possível sequer fazer doações pessoais para os candidatos. Toda a verba de campanha sairia do fundo partidário: o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) receberia R$ 7 para cada eleitor brasileiro. Essa verba seria dividida entre todos os partidos, que distribuiriam entre seus candidatos (ver infográfico).

Já a Câmara dos Deputados, que também estuda sugestões para a reforma política, deve apresentar uma proposta mais branda: ao invés de deixar o financiamento de campanha exclusivamente nas mãos do governo, a proposta permitirá doações de pessoas físicas, impondo um limite proporcional à renda. “Não dá para impedir que alguém que simpatize com um candidato faça uma doação”, comenta a deputada federal Rosane Ferreira (PV-PR), integrante da comissão. A diferença para a campanha atual seria a proibição de doações por parte de empresas.
Equilíbrio
Para o professor de Direito Constitucional da Universidade de Fortaleza (Unifor) Martônio Barreto Lima, o financiamento público de campanha seria uma forma de tornar as eleições mais equilibradas. “Isso ameniza a disparidade econômica entre os candidatos, o que reforça a qualidade da democracia”, comenta.
Já para o sociólogo Caetano Ernesto Pereira de Araújo, o financiamento público de campanha é positivo, mas a restrição a qualquer tipo de doação acaba sendo exagerada. “O ideal não seria uma legislação que impedisse doações de pessoas físicas, mas que fixasse um teto numérico, em números absolutos”, afirma. No modelo atual de financiamento, doações de pessoas físicas são limitadas de acordo com a renda do doador – o que coloca em patamares diferentes um empresário multimilionário e um trabalhador comum, já que o primeiro pode investir milhares de reais e o segundo, apenas algumas centenas.
Um exemplo de como isso funciona é o sistema de doações dos Estados Unidos. Lá, um cidadão comum tem direito de doar até US$ 2,5 mil, independentemente de sua classe social. Ao contrário do que ocorre no Bra­­sil, esse tipo de financiamento é de extrema importância e ajuda, efetivamente, a definir eleições, desde o nível municipal até a Presidência da República. “É uma forma de os partidos mo­­bilizarem diretamente os eleitores”, comenta Araújo.

Custo poderia ser de R$ 1 bi por eleição
Caso o modelo proposto pela Comissão de Reforma Política do Senado seja o adotado, o gasto total deve chegar próximo de R$ 1 bilhão. Segundo a proposta, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) receberia da União o equivalente a R$ 7 para cada eleitor brasileiro, que seriam repassados de forma proporcional aos partidos (ver quadro). Em 2010, havia 135.804.433 eleitores no país – e as eleições custariam R$ 950 milhões.
Para a economista Adriana Cuoco Portugal, trata-se de uma questão de custo-benefício. “Se você olhar para todo o recurso do governo, [esse montante] pode até parecer pouco. Mas R$ 1 bilhão em um país com tantas necessidades de infraestrutura, educação e saúde, por exemplo, é um dinheiro que pode fazer a diferença”, comenta. “Não faria um gasto desses em algo que não tem sua efetividade comprovada quando o país precisa de outros investimentos”.
Para Adriana, os resultados reais de uma política de financiamento público não estão bastante claros. De acordo com ela, as instituições de controle no Brasil ainda não estão fortes o suficiente para coibir o financiamento paralelo de campanhas – o “caixa dois”. Caso essa situação prevaleça (financiamento público oficial com a atuação de empresas às escondidas), o cenário político poderia ficar ainda pior.
“O que acontece sem a existência de instrumentos fortes é a criação de um gasto a mais para o governo e a manutenção da influência política de quem financia campanhas. Conside­­­ran­­­do o histórico, a tendência é que isso aconteça, no curto e médio prazo”, comenta. En­­­tretanto, para a economista, as instituições de controle brasileiras estão sendo fortalecidas no atual momento, o que poderia privilegiar a criação de um sistema de financiamento público de campanha no longo prazo.
Já para o professor de Direito Constitucional da Universidade de Fortaleza (Unifor) Martônio Barreto de Lima, o fortalecimento do controle é necessário, mas vale a pena tentar implantar o modelo de financiamento público no país. Para ele, o alto custo que seria repassado aos cofres públicos é aceitável. “Toda a sociedade tem que pagar pela qualidade da democracia que tem. Já gastamos muito com a Justiça Eleitoral, com o sistema eletrônico de votação, mas é um investimento na democracia”, afirma.
Chico Marés

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